quarta-feira, 24 de abril de 2024

RIVAIS (2024) - “Challengers” de "Luca Guadagnino"


 Um jogo de sedução e articulação.


Rivais “Challengers” é uma partida de tênis elegante e sexy na mesma medida que envolve o espectador com subtextos carregados por performances fortes de seu trio central. Os personagens sofrem oscilações de suas jornadas emocionais enquanto os observamos crescer juntos e separados. Há uma sensação palpável de desejo, luxúria, inveja, raiva e pena em cada um deles, criando uma interação fascinante e uma tensão digna de final de campeonato.

Tashi (Zendaya) é uma tenista que virou treinadora e transformou seu marido de um jogador medíocre em um campeão mundialmente famoso. Para tirá-lo de sua recente série de derrotas, ela o faz jogar um evento desafiador com nível inferior ao torneio profissional. A tensão logo aumenta quando entre seus concorrentes do outro lado da rede está Patrick, seu ex-melhor amigo e ex-namorado de Tashi. A história se desenrola em uma série de flashbacks emoldurados por uma luta pelo campeonato entre Patrick Zweig (Josh O'Connor) e Art Donaldson (Mike Faist).

O diretor Luca Guadagnino (Me Chame pelo Seu Nome e Suspiria) entrega novamente um cinema vibrante e de qualidade envolto a uma atmosfera clichê de hollywood, o romance esportivo. O tema já teve milhares de filmes e ainda assim Rivais se destaca e apresenta certa profundidade na entrega. Guadagnino enfatiza seu "bromance" homoerótico com um psicológico triângulo amoroso central com sinais de defeito.

Os espectadores não precisam saber muito sobre tênis para apreciar as cenas esportivas muito bem filmadas e divertidas, grande parte do filme é ambientada na batida techno de Trent Reznor e Atticus Ross, o que aumenta a energia em acompanhar a partida decisiva. Ainda que os acontecimentos dramáticos tragam poucas surpresas, Rivais é bastante convincente, mas tal como os seus dois atraentes protagonistas masculinos, não consegue atingir o seu potencial por completo. 

O cinema pop americano demonstra interesse em contar histórias com mais diversidade ainda rodeado de caretice, talvez até do seu próprio público alvo. Ainda bem que temos Luca Guadagnino para incomodar essa parcela do público que só queria uma comédia romântica para satisfazer sua zona de conforto e se depara com um thriller romântico fora da caixinha.



⭐️⭐️⭐️⭐️ Muito Bom 🙃

O filme estreia nos cinemas nesta Quinta-feira 25 de Abril. 

terça-feira, 16 de abril de 2024

GUERRA CIVIL (2024) "Civil War" de "Alex Garland"

 


♨️  Um grito de desilusão ao desequilíbrio do mundo. ♨️

Guerra Civil é uma bela e intensa visão distópica, não só da guerra que devasta cidades mas também da nossa  ignorância em compreender o que é a guerra, quando é necessária ou se é realmente necessária. Tudo é registrado pela lente de uma jornalista, em um filme que provoca a reflexão em pequenos atos de grandes proporções.

Lee (Kirsten Dunst) se encontra na cidade de Nova York. Ela é uma das melhores fotógrafas de guerra do ramo e desenvolveu essa reputação por meio de astúcia, talento e um nível de bravura. Ela se junta ao colega Joel (Wagner Moura) muito motivado pela adrenalina, Jessie (Cailee Spaeny) uma jornalista novata resgatada por ela da explosão de um homem-bomba e Sammy (Stephen McKinley Henderson) um jornalista veterano do que sobrou do New York Times. Os quatro querem viajar para o Sul com o objetivo de entrar em Washington DC, entrevistar o presidente e responsabilizá-lo.

O cenário é caótico. As Forças Ocidentais estão perto de tomar o Capitólio, muito perto. Há também o fato de estarem numa nação com mais armas do que pessoas, em um país onde os cidadãos satisfazem os seus caprichos mais sombrios e se autodenominam patriotas. A decadência americana surge dentro de sua própria soberba e perdida em estereótipos.

Muito se fala sobre sair correndo para defender a liberdade, seja lá o que isso signifique, ou ignorar as atrocidades porque “não é da nossa conta”. É por isso que o jornalismo é importante. A imagem certa no momento certo pode colocar um conflito em foco. Alguns argumentos também podem ser  ignorados com uma eficiência brutal. Qualquer um pode ter uma opinião sobre a Guerra na Ucrânia ou na Palestina mas a opinião não substitui a realidade das famílias mortas.

Infelizmente, muitos de nós somos hostis ao jornalismo, especialmente quando este nos mostra algo de que não gostamos. Isso leva à polarização, que leva ao conflito. Quem sobrou para documentar a verdade das coisas? Ainda são os jornalistas. Embora você possa pensar que o novo filme de Alex GarlandGuerra Civil, trata de certas coisas, o que realmente trata é o poder e a responsabilidade que cercam o jornalismo de combate. Um filme tenso, atual, necessário e poético.


⭐️⭐️⭐️⭐️ ÓTIMO

👀 QUINTA-FEIRA (18/04) nos Cinemas! 

quarta-feira, 3 de abril de 2024

UMA FAMÍLIA FELIZ (2023) de José Eduardo Belmonte

 


         👨👩👧👦 Os dramas da maternidade e das pressões sociais 👩👧👦

   Uma família feliz é um thriller psicológico ou um suspense dramático com doses homeopáticas de tensão, o filme do experiente diretor José Eduardo Belmonte foi gravado em Curitiba e tem como protagonistas duas estrelas do audiovisual brasileiro, Grazi Massafera e Reynaldo Gianecchini. Eles desbravam as tensões das relações familiares e do mundo de aparências de um condomínio perfeito, em uma trama sobre infância e maternidade.

   Eva (Grazi) acabou de dar à luz o seu terceiro filho e se depara com a angústia de uma depressão pós-parto em meio a uma vida burguesa supostamente perfeita. O ar tranquilo de sua família feliz é invadido por acontecimentos estranhos quando suas filhas gêmeas aparecem machucadas. Eva é acusada e retaliada pela comunidade. Isolada e questionada por seu próprio marido, ela precisa superar sua fragilidade para provar sua inocência e reestruturar sua família.

   A história original e o roteiro do longa são do escritor Raphael Montes (“Bom Dia, Verônica”), que também estreia como diretor-assistente. O argumento também deu origem ao livro homônimo, já disponível nas livrarias. O filme é 15º longa-metragem dirigido por José Eduardo Belmonte, diretor que tem uma história construída em Brasília no início dos anos 2000, inclusive, era comum seus filmes serem exibidos no Festival de Brasília, sempre com produções muito ousadas, como “A Concepção” (2005) que continua como um dos mais interessantes de sua filmografia.

   O que tinha de diferencial no diretor em suas produções se tornou seu principal pecado ao lidar com o comum, a limpeza da sociedade era questionada e destruída por uma cena underground vibrante e corajosa, Uma família feliz é o oposto disso, muito polido e sem qualquer frescor social, os temas são tratados de forma superficial e se salva pelo suspense bem construído e uma Grazi Massafera em boa atuação, mas é pouco brilho e muito potencial. 

   O filme é uma boa produção que se perde durante sua condução que transita no lugar comum e não se sustenta de forma efetiva no seu mistério, perde potencial em se concentrar nos clichês do drama de sua protagonista, entregando algo próximo de um folhetim da TV e se afastando do cinema.


⭐️⭐️ REGULAR

👀 O filme estreia nos cinemas brasileiros nesta quinta-feira, 4 de abril.


quarta-feira, 27 de março de 2024

O HOMEM DOS SONHOS (2023) - "Dream Scenario" de "Kristoffer Borgli"

 


O delírio tragicômico do cancelamento.

  O cineasta norueguês Kristoffer Borgli juntamente com a produção do visionário Ari Aster (Hereditário,  Midsommar) apresentam uma obra sobre o caos existencial com toques de crítica social recheado de camadas interessantes. O Homem dos Sonhos pode ser monótono em alguns momentos mas presenteia o expectador com mais uma atuação brilhante de Nicolas Cage, uma fantasia cinematográfica sobre a paranóia da exposição e do cancelamento.

    O infeliz homem de família Paul Matthews (Nicolas Cage) descobre um dia que várias pessoas não relacionadas - algumas das quais ele nem conhece - estão sonhando com ele. Ele aparece nesses sonhos despreocupado com o que quer que esteja acontecendo, ignorando todas as perguntas e apelos. Aos poucos Paul se torna uma pequena celebridade. Mas então, por razões que fogem ao controle, o Paul dos sonhos começa a se tornar um ator ativo nos sonhos: primeiro amoroso, depois malévolo; o que começou como um fenômeno social inofensivo transforma-se num problema que exige vergonha coletiva e reações violentas. 

  O Homem dos Sonhos é uma comédia obscura que segue com muitos elementos atrativos mas carece de coragem para seguir as suas implicações até sua conclusão. Enquanto o potencial de terror vai se esgotando, o delírio surge como um espetáculo crescente, a metáfora sobre uma geração de pessoas que nasceram conectadas e inevitavelmente vivem o sucesso e o fracasso em questão de segundos, vira um gatilho perigoso que por pouco não se esvazia na escolha poética do diretor.

   Por fim, se torna uma experiência cinematográfica com cenas memoráveis, que recupera a tração perdida à medida que tudo se consolida, é aquele tipo de filme que ganha força tempos depois e seu personagem principal poderia facilmente ter outras vivências exploradas.



⭐️⭐️⭐️ BOM

O Filme estreia nos cinemas nesta Quinta-feira 28/03 pela Califórnia Filmes.






terça-feira, 19 de março de 2024

KUNG FU PANDA 4 - (2024)


 Somente para os fãs.


  Kung Fu Panda 4 mesmo divertido e atraente, perde a força em trama automática e sem brilho. Repete fórmulas utilizadas nos filmes anteriores sem nada de novo a acrescentar, é aquele "arroz com feijão" para sustentar os jovens fãs da franquia. 

    Depois de três aventuras arriscando a vida para derrotar os mais poderosos vilões com sua coragem incomparável e incríveis habilidades em artes marciais, o urso panda Po, o Dragão Guerreiro (Lucio Mauro Filho) embarca em nova jornada. Ele foi escolhido para se tornar o Líder Espiritual do Vale da Paz e precisa encontrar e treinar o mais rápido possível um novo Dragão Guerreiro antes de assumir sua nova e imponente posição. 

  Essa missão tem um obstáculo com a chegada da vilã Camaleoa (Taís Araujo), um pequeno lagarto-fêmea que pode se transformar em qualquer criatura, grande ou pequena. Camaleoa ameaça todo equilíbrio conquistado anteriormente por Po. Em sua cruzada para proteger o Vale da Paz da inimiga, Po encontra a astuta ladra Zhen (Danni Suzuki), uma raposa-das-estepes e juntos os dois vão formar uma inusitada dupla e aprender a trabalhar em parceria. O resto é o enredo de sempre desse tipo de história.

      Existem alguns problemas que prejudicam o filme desde o início. Para começar, os conflitos básicos (Po lutando com suas mudanças de responsabilidades e um bandido fazendo coisas ruins) já foram melhor resolvidos antes nesta franquia. O enredo também sofre de uma suavidade geral que surge quando se joga pelo lugar seguro o tempo todo. 

     Algumas boas ideias em Kung Fu Panda 4 como Po experimentando uma cidade grande pela primeira vez e uma vilã que aprendeu feitiçaria para superar sua pequena estatura não são suficientes, a história nunca é desenvolvida para que os pontos da trama pareçam significativos. É tudo muito obrigatório de uma sequência. A trilogia inicial consegue sobreviver sem esse capítulo. Vale somente pela comédia.


⭐️⭐️ REGULAR

👀 Nos cinemas



quarta-feira, 13 de março de 2024

A FLORESTA DOS SUSSURROS (2023) de "Thiago Cazado"

🏳️‍🌈 A liberdade sexual e o universo dos desejos ocultos 🏳️‍🌈

  A Floresta dos Sussurros é pautado em vivências (ou desejos) comuns à cultura LGBTQIAPN+. O filme, assim como outros exemplares do gênero como "Vento Seco (2020)" e "Um Estranho no Lago (2013)" mostra questões sexuais latentes da comunidade, como o livre encontro de pessoas com anseios sexuais reprimidos, ambientação campestre em um universo habitado por homens e o sentimento de culpa de quem pode "cair de paraquedas" nesse universo. A verdade é que toda a cidade grande tem lugares como esse. 

  Na história, Paulo (Léo Carius) vive uma relação conturbada com a esposa Jessica (Maria Garcia). Após uma séria discussão ele sai para pedalar e acaba se perdendo em uma região conhecida como "A Floresta dos Sussurros", um local secreto onde homens se encontram para fins sexuais. Infeliz no casamento, Paulo nem imagina o quanto sua vida está prestes a mudar, principalmente quando conhece Luigi (Thiago Cazado), um jovem rapaz que exala sexo e liberdade. 

   É a partir desse universo povoado pelo desejo e pelo encontro com o desconhecido que se desenrola o romance "proibido" de “A Floresta dos Sussurros”, o realizador brasiliense Thiago Cazado, reconhecido pelo trabalho no cinema e no teatro com a temática LGBTQIAPN+, aborda com bastante naturalidade temas atuais e constantes na vida da comunidade, filmes do diretor como “Sobre Nós” (2017) e “Primos” (2019) são exemplos dessa abordagem moderna e sensível. Outro aspecto comum entre este e outros trabalhos de Thiago Cazado é o fato de ele assumir diferentes papéis no projeto, atuando na produção, roteiro e direção. 

  Ainda sem previsão de estreia em circuito nacional, A Floresta dos Sussurros está sendo exibido em sessões especiais em algumas cidades e apresenta uma história com tons de comédia, romance e muita coragem de apresentar uma leitura contemporânea que se comunica muito bem com seu público alvo. 

⭐️⭐️⭐️ BOM 🏳️‍🌈 



👀 Sem previsão de estreia nos cinemas, o Meu Hype conferiu o filme na Sessão Especial realizada no Cine Brasília no DF

quarta-feira, 6 de março de 2024

TODOS NÓS DESCONHECIDOS (2023) - "All of us Strangers" de "Andrew Haigh"

 


🤯 Uma reflexão contra os preconceitos impostos🤯

    A premissa enigmática da trama de "Todos Nós Desconhecidos" (All of us Strangers) e a atuação emocionante de Andrew Scott reforçam essa jóia como uma variante elegante das obras de David Lynch. Uma fantasia que mergulha na indefinição da fronteira entre o mundo dos vivos e dos mortos e a pendência de sentimentos consigo mesmo. 

     Andrew Scott interpreta um escritor chamado Adam, que acaba de alugar um apartamento em um prédio vazio e solitário em Londres. Um dia, ele faz uma viagem de trem para visitar a casa de sua infância supostamente vazia e fica surpreso ao encontrar seus pais (Jamie Bell e Claire Foy) apesar de terem morrido em um acidente de carro quando ele era criança. Adam faz algo que não foi capaz de fazer quando seus pais estavam vivos tendo consequências em seu presente. 

  Esta parte do filme é bastante comovente, seus pais começam a conhecer Adam profundamente e entender sua vivência. Adam finalmente percebe que, por mais que ame seus pais, suas repetidas visitas a eles ameaçam prendê-lo no passado. Isso é como se fosse um trauma que volta a sua lembrança repetidamente. Sua conversa final com eles é dilacerante, até porque se passa em uma visão da vida após a morte. 

     Há toda uma outra metade do filme com Adam se apaixonando por Harry (Paul Mescal), uma nuance importante de sua vivência oferecendo uma exploração comovente da solidão, do trauma, da dor, do amor e dos caprichos do tempo. Embora o filme possa não fornecer resoluções fáceis, o cinema contemporâneo agradece o frescor delirante dessa obra moderna e impactante. 


⭐️⭐️⭐️⭐️ Muito Bom 

Em cartaz nos cinemas!






sexta-feira, 1 de março de 2024

DUNA: PARTE DOIS (2024) de "Denis Villeneuve"

 


Um novo clássico do cinema!

     Duna: Parte Dois do diretor Denis Villeneuve, não apenas chega tão perto quanto se poderia esperar de um blockbuster, mas também supera a conquista já significativa do primeiro filme. Esta sequência, praticamente impecável, enche os olhos com uma mitologia provocante e atual, com uma fotografia arrebatadora e um elenco de primeira. Uma experiência refinada como em grandes obras-primas do cinema fantástico de Hollywood.

  A jornada mítica de Paul Atreides (Timothée Chalamet) é iniciada algumas horas depois dos acontecimentos do primeiro filme e mostra a integração de Paul e sua mãe, Jessica (Rebecca Ferguson), na cultura e nas tribos Fremen. Nesse tempo, Paul e Chani (Zendaya) se apaixonam, e juntos iniciam uma campanha contra os seus inimigos opressores. Paul se aproxima de um de seus piores pesadelos - o cumprimento de uma profecia que ele previu, uma guerra santa travada em seu nome.

  A adaptação cinematográfica de Duna consegue ser tão relevante quanto a importante obra da literatura de ficção científica. São poucos manuscritos do gênero que manipulam com tanta maestria uma vasta diversidade de temas que permeiam atualmente a sociedade.

Na obra literária original (1965), Frank Herbert se aprofunda nas questões acerca do planeta Arrakis, um deserto de grande importância: o único lugar capaz de extrair o mélange – a especiaria. Tendo a criação de mundo como o principal alicerce de sua obra, o autor aborda temas fundamentais como a religião e as guerras santas em nome do protagonista, Paul Atreides, além da ecologia do planeta e todas as tramas políticas que envolvem o Imperium, uma espécie de feudalismo intergaláctico. Denis Villeneuve se consagra e não se perde na riqueza de Duna, tudo está no seu devido lugar.

   Em linhas gerais, os elementos fantásticos de Duna provocam o espectador a uma das indagações filosóficas mais interessantes desde Star Wars, a tendência natural da humanidade de se render, de tempos em tempos, à uma figura messiânica e de abriram mão de seu próprio livre-arbítrio. Além da representação clara da figura messiânica em Paul Atreides, a história abrange também as consequências de uma filosofia de governo pautadas na religiosidade. Os exércitos fremen partem para um jihad – uma guerra santa e cometem genocídios em nome de seu profeta. 

  A jornada de Duna é bastante rica de questionamentos confrontando o futuro com o que se vive agora. O cinema entregue por Denis Villeneuve é vivido, lindo e atemporal, uma obra prima!


⭐️⭐️⭐️⭐️⭐️ Novo Clássico!

👀 Em cartaz nos cinemas! 

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

DIAS PERFEITOS - Perfect Days (2023) de "Wim Wenders"

 


🚺🚹 A beleza simples do mundo cotidiano! 🚹🚺


       O longa Dias Perfeitos (PerfectDays) é uma reflexão profunda, comovente e poética sobre como encontrar a beleza no mundo que nos rodeia sem a constante busca por padrões de felicidade, status e modernidade.

       Hirayama (Koji Yakusho) parece totalmente satisfeito com sua vida simples como limpador de banheiros em Tóquio. Fora de sua rotina diária muito estruturada, ele gosta de sua paixão pela música, fotografia e livros. À medida que nos juntamos a ele na sua rotina metódica, uma série de encontros inesperados começa gradualmente a revelar um passado oculto em sua vida feliz e harmoniosa.

       O aguardado retorno ao cinema de ficção de Wim Wenders (Paris, Texas, Asas do Desejo), leva o roteirista e diretor a Tóquio para contar uma história que celebra as alegrias ocultas e as minúcias da cultura japonesa. O realizador combina uma representação revigorante e não estereotipada da capital japonesa com uma trilha sonora de sucessos icônicos dos anos 60 e 80, que transita entre The Rolling Stones, Patti Smith, The Kinks, Van Morrison e outros. Essa reflexão sutil, e de certa forma brilhante, reforça o belo no mundo nem tão banal e comum que nos rodeia, como árvores, paisagens e o silêncio.

       Os momentos de contemplação são encantadores e trazem uma reflexão comovente e poética sobre a busca da beleza nas pequenas coisas, ser feliz consigo mesmo, em um filme que te joga pra cima e mostra que os dias perfeitos são todos em que vivemos sem muitas distinções de bom e ruim mas sempre belo. Um presente de Wim Wenders a quem sabe viver mais com menos.

⭐️⭐️⭐️⭐️ ÓTIMO

🏅O filme concorre ao Oscar 2024 na categoria Filme Internacional. O ator Koji Yakusho foi premiado em Cannes como "Melhor Ator" pela sua brilhante atuação.

👀 O filme estreia nesta Quinta-feira 29/02 nos cinemas e em breve estará disponível no Mubi.

 

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

O MENINO E A GARÇA (2023) de "Hayao Miyazaki "


 🧍‍♂️🦤 Um filme anti-guerra para um mundo em constante guerra. 🦤🧍‍♂️

    O Menino e a Garça começa com uma sirene de alerta de um ataque aéreo e ressalta a importância das crianças e das novas gerações em superar os erros do passado, buscando um futuro melhor, de mais compreensão e reciprocidade. 

    Depois de perder a mãe durante a guerra, o jovem Mahito muda-se para a propriedade de sua família no campo. Lá, uma série de eventos misteriosos o levam a uma torre antiga e isolada, lar de uma travessa garça cinzenta. Quando a nova madrasta de Mahito desaparece, ele segue a garça até a torre e entra num mundo fantástico partilhado pelos vivos e pelos mortos, embarcando em uma jornada épica. Mahito deve descobrir os segredos deste mundo e a verdade sobre si mesmo. 

    O roteiro é assumidamente baseado na experiência de infância do próprio realizador e idealizador do Studio Ghibli, Hayao Miyazaki, ganhador do Oscar por A Viagem de Chihiro, em 2003, ele é considerado uma lenda viva da animação e do cinema japonês. Entre seus filmes estão, também, Meu Amigo Totoro, O Castelo Animado, Vidas ao Vento e Ponyo: Uma Amizade que Veio do Mar

     O Menino e a Garça coleciona indicações e prêmios como Melhor Longa em Animação de 2023, além de concorrer a uma estatueta no Oscar 2024, o filme já foi prestigiado como Melhor Filme de Animação no Globo de Ouro, no BAFTA e no New York Film Critics Circle Award

     O longa animado é relevante e encantandor com uma mensagem firme para um mundo ainda contaminado com sentimentos ruins de guerra. Entre as mensagens do longa está a possibilidade da paz entre as nações num mundo marcado pelo conflito. O mundo lúdico de uma criança frágil e traumatizada entrega a reflexão da constante luta pela paz em um mundo nada confortável.


⭐️⭐️⭐️⭐️ ÓTIMO 

👀 Em cartaz nos cinemas! 🎬

🧍‍♂️🦤


terça-feira, 20 de fevereiro de 2024

MEU AMIGO ROBÔ (2023) - "Robot Dreams" de "Pablo Bearger"

 


🤖 Um dos filmes mais humanos do ano e não há nem um único humano no filme. 🤖 

    A animação Meu Amigo Robô, (Robot Dreams) mostra a beleza agridoce de uma amizade pura e cheia de sentimentos sem nenhuma fala dita pelos personagens. 

   O cachorro DOG mora em Manhattan e está cansado de ficar sozinho. Um dia ele decide comprar um robô para ser seu companheiro. A amizade deles floresce, até que se tornem inseparáveis, ao ritmo de Nova York nos anos 80. Em uma noite de verão, DOG, com muita tristeza, é obrigado a abandonar ROBÔ na praia sem a certeza se irão se encontrar novamente. 

   No cenário atual da animação, é raro ver um recurso 2D desenhado à mão que não seja oriental ou até mesmo de grandes estúdios americanos, esta co-produção hispano-francesa de estúdio independente é total mérito de seu criador Pablo Bearger, que apenas com uma imagem estática em mente criou movimentos semelhantes a seus quadros de storyboard com um mínimo de animação, enquanto os cenários e personagens têm cores imperfeitas e semblantes divertidos.
 
   O filme é um trabalho excêntrico e ao mesmo tempo doce, cada faceta técnica, incluindo sombras, iluminação expressiva e fundos multicoloridos captura uma antiga e clássica Nova York, o longa animado possui diversas referências a cultura pop e toda magia de outros desenhos de épocas passadas. Os sentimentos capturam a magia das expressões de seus personagens com técnica parecida com o sucesso Shaun, O Carneiro. Sentimentos expressos sem nenhuma única palavra. 

   Mesmo com seus momentos mais sentimentais, a integração de uma comédia oportuna se une a muitas sequências com humor melancólico e irônico. É um filme poético, lírico e nostálgico tanto no cenário quanto na narrativa, Meu Amigo Robô é uma experiência cinematográfica incrível, madura e bastante sincera. Uma grata surpresa que não por acaso, concorre a Melhor Animação no Oscar 2024. Imperdível. 


⭐️⭐️⭐️⭐️ ÓTIMO 🤖🤖🤖

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2024

ZONA DE INTERESSE (2023)

 

🏛 A "vida normal" dos homens e mulheres envolvidos na terrível história do Holocausto. 🏛 

Chega aos cinemas brasileiros o novo filme do diretor Jonathan Glazer (Sob A Pele, 2013), após uma passagem aclamada pelo Festival de Cannes 2023 e depois de receber cinco indicações ao Oscar 2024 - incluindo o de Melhor Filme e Melhor Filme Internacional, Zona De Interesse é uma produção impressionante e um filme perturbador sobre um tema delicado e bastante dolorido. 

A produção retrata a vida de um oficial da SS, a polícia nazista, Rudolf Höss (interpretado por Christian Friedel), sua mulher Hedwig (Sandra Hüller), eles lutam para construir uma vida ideal para sua família em uma confortável casa vizinha ao campo de concentração de Auschwitz. 

O filme é um espetáculo, a começar por essa abordagem provocativa. (Mostra todo o horror do nazismo sem mostrar, de fato, quase nada). Tudo é sugerido. A cada cena qualquer do filme é possível  escutar ao fundo da cena barulhos de tiros, sirenes, gritos de pessoas em agonia, e visualizar por de trás da fotografia do filme a fumaça do fogo da câmara de gás e toda poluição causada pelo campo de concentração. A experiência sensorial praticamente joga o expectador para dentro da história. 

Diferente de outros filmes que tratam sobre o holocausto, este dispensa o drama. As atuações cruas, nada dramáticas servem para representar com fidelidade a energia que pairava por ali. Ainda que os nazistas não considerassem o extermínio algo ruim, a atmosfera ao redor daquele contexto nunca poderia ter uma energia boa. A colorida e confortável residência da família nazista esconde a violência contra os judeus. 

O filme não foge da sua sinopse e talvez seja seu trunfo e também seu maior problema, não aprofundar narrativas. O totalitarismo nazista produziu seres incapazes de pensar, apenas destinados a cumprir ordens e perderem o senso moral ou a disposição de julgar suas próprias ações.  (Qualquer semelhança com o movimento atual dos conservadores não é mera coincidência). 

Como cinema o filme vale muito ser apreciado mas não espere algo novo de tudo que já sabemos sobre o holocausto. 

⭐️⭐️⭐️⭐️ ÓTIMO 


sexta-feira, 2 de fevereiro de 2024

POBRES CRIATURAS (2023)

 


🧠👁 O potente cinema de Yorgos Lanthimos provoca não só a sociedade polida, como o cinema "careta" e o público conservador. 👁🧠


         🧠 Pobres Criaturas é um filme de romance e ficção científica baseada no livro homônimo de Alas Dairgrey e referenciando o clássico frankenstein, a história se passa na Era Vitoriana e acompanha Bella Baxter (interpretada por Emma Stone), trazida de volta à vida após seu cérebro ser substituído pelo do filho que ainda não nasceu. O experimento é realizado pelo doutor Godwin Baxter (Willem Dafoe), um cientista brilhante, porém nada ortodoxo. 

      👁 Essa brilhante fábula cômica evidencia Emma Stone, um monstro rude, punk e moderno de Frankenstein que envergonha até mesmo a Barbie. O diretor celebra o sexo como forma de libertação feminina. A extravagância extremamente imaginativa e estimulamente exagerada, transforma Pobres Criaturas em uma tour bizarro por lugares e ocasiões onde Bella entrega momentos estranhos e divertidos. Só esteja preparado para temas adultos que podem perturbar ou ofender alguns. 

        🧠 Em um filme onde a performer principal não só aparece nua como praticando um grande número de cenas de sexo, seu uso virtuoso do que faz do seu corpo - a forma como se movimenta entre as cenas, a comédia (e naturalidade) que exala e o jogo de emoções que transmite - sem dúvida, é um dos elementos mais importantes para o espectador quebrar a caretice. O elenco também conta com Mark Ruffalo, Jerrod Carmichael e Ramy Youssef.

   👁 Para aqueles familiarizados com a filmografia de Yorgos Lanthimos, desde o assustador Dente Canino, até aos horrores mais simples do século XVIII do seu filme anterior (A Favorita), Pobres Criaturas pode ser visto como o culminar do seu trabalho. Nos seus filmes anteriores vimos versões não naturais e selvagens da nossa realidade, mas neste o mundo é como o cineasta quer: como se fosse uma tela, uma pintura, além de ser filmado com um design de produção com cenários deslumbrantes, repletos de detalhes barrocos, figurinos, cabelos e maquiagem, tudo impecável. Estamos, sem dúvida, diante do trabalho mais louco, divertido e obsceno do ano. 



👀🎬 Em Cartaz no Cinemas!

⭐️⭐️⭐️⭐️ ÓTIMO 


🧠👁

terça-feira, 23 de janeiro de 2024

BIZARROS PEIXES DAS FOSSAS ABISSAIS (2024)

 


🐠 Uma jornada em busca de superação aos vazios. 🐠 A animação brasileira anárquica tem uma história perfeitamente comum, extraordinária em vários aspectos e emocionante, que perpassa todos os traços e movimentos caóticos . 


    🐠 Uma mulher com exóticos superpoderes, uma tartaruga com transtorno obsessivo-compulsivo e uma nuvem com incontinência pluviométrica em uma insólita jornada até as profundezas do oceano, isso é o suficiente de informações para embarcar nessa excêntrica viagem. O premiado diretor de curtas de animação Marcelo Marão, mais conhecido como Marão, estreia na direção de um longa após catorze curtas em quase trinta anos trabalhando com animação, seu primeiro longa é também seu primeiro filme com uma protagonista feminina, dublada pela atriz Natália Lage. O elenco de vozes conta ainda com Rodrigo Santoro e Guilherme Briggs

     🐠 Essa jornada funciona apenas para possibilitar bizarras situações de humor nonsense durante todo o filme, o trio de personagens centrais tem uma química muito envolvente e cativante, a comédia flui de forma bem leve. A animação em 2D tradicional é utilizada seguindo a técnica chamada de full animation, na qual todo o personagem se move e não apenas partes dele: se ele corre, todo o personagem é redesenhado para movimentar os braços e pernas e também os cabelos e roupas, criando um movimento mais fluido essencial para as - muitas - cenas de ação e de luta deste que é um longa animado de uma super heroína. 

       🐠 Marão tem uma técnica bastante autoral, com um visual interessante, traços bonitos transitando no preto e branco e no colorido. O enredo maluco convence com algumas restrições, nem sempre tudo está alinhado gerando um pequeno ruído mas nada que prejudique o resultado final bastante satisfatório. 


🖤🖤🖤 BOM 🙃 🐠🐠



terça-feira, 9 de janeiro de 2024

DOGMAN (2023)

 


🐶 A todo desafortunado Deus envia um cão... 🐶 ou vários no caso de Douglas (Caleb Landry Jones), Dogman tem início morno e Luc Besson enferrujado mas no geral é um filme que tem alma e coração! 


     Uma história lúdica sobre um anti-herói marcado pela tragédia. Tudo tem início com as consequências traumáticas de uma infância violenta e disfuncional de Douglas, um rapaz bastante traumatizado, que encontra a salvação no amor dos seus cães, numa relação em que o comportamento animal e humano se funde. Com o tempo, Douglas encontra um certo conforto e transforma-se num criminoso, dividindo o seu tempo a supervisionar o sucesso dos crimes da sua matilha de cães, enquanto interpreta clássicos da música em uma boate de transformistas.


       Neste thriller de sobrevivência e vingança, repleto de complexidade e tristeza, conseguimos algo descaradamente divertido e perturbador, ainda que singelo. É um espetáculo de terror e fantasia que também funciona como um drama comovente sobre estranhos e fracassados. Não há nada excepcional ou brilhante, até pode decepcionar em diversos aspectos, mas ainda assim é uma visão única e elevada por um desempenho totalmente atraente e valioso de Caleb Landry Jones com perfomances lindas de Edith Piaf e Marilyn Monroe dentro da sua paixão por Shakespeare e pelo teatro. 


     O filme tem alguns momentos divertidos mostrando os cães agindo em equipe e também em defesa de seu dono, nem sempre fazendo o bem mas sempre fiel aos interesses de seu mestre. A produção teve sua estreia no último Festival de Veneza sem muito alarde e sua trajetória nos cinemas foi muito tímida, espelhado em uma recepção morna e bastante irritada de críticos e fãs do diretor Luc Besson , conhecido por obras atemporais como O Quinto Elemento e O Profissional, muito também reagindo as polêmicas recentes vividas pelo diretor fora das telas. Longe disso, é um filme que mistura vários elementos de drama e ação e se torna um bom entretenimento fantástico.


⭐️⭐️⭐️ BOM ☺️ 



quarta-feira, 27 de dezembro de 2023

SALTBURN (2023)

 


❤️‍🔥 O Escândalo cinematográfico Saltburn de Emerald Fennel é uma farofa requentada, divertida e traumatizante, para amar e odiar na mesma medida. ❤️‍🔥 

   Uma história lindamente perversa de privilégio e desejo. Lutando para encontrar seu lugar na Universidade de Oxford, o estudante Oliver Quick (Barry Keoghan) se vê atraído para o mundo do charmoso e aristocrático Felix Catton ( Jacob Elordi de Euphoria), que o convida para passar um verão em Saltburn, a extensa propriedade de sua excêntrica família. Entre o sentimento de paixão pelo rapaz rico e a luta para pertencer a alta sociedade, Oliver vive uma ode a desejos carnais e luta de classe. 

        Um filme repleto de talento bruto e ideias incompletas, a cineasta por trás de Bela Vingança realiza um "fake" thriller psicológico vagamente satírico. E embora seja difícil não desejar que a arte pop de Fennell tivesse um pouco mais de efervescência, propriedade e originalidade, é ainda mais difícil ficar bravo com alguém por escalar Barry Keoghan, em uma performance irresistível como um rapaz estranho no estilo Talentoso Ripley que sistematicamente se vinga de aristocratas. 

        O vínculo entre os personagens principais transita também nas cenas polêmicas, seladas por um certo homoerotismo. O fato de “Saltburn” relutar em enfatizar isso é inicialmente um dos maiores pontos fortes e ajuda a explicar todo sentimento de raiva envolto as atitudes. Há tanta ambigüidade na cena em que Oliver bebe a água que sobrou do banho de Felix, ou quando mostra Oliver transando em um cemitério e pintando o rosto com sangue menstrual, a sua sexualidade permanece indefinida, a consciência de Felix revela-se ainda mais confusa até o ato final com uma das cenas mais legais de 2023. 

    Com uma fotografia belíssima, elenco requintado ( Rosamund Pike rouba a cena quando aparece) e trilha sonora cool (Arcade Fire, Ladytron, Cold War Kids, Bloc Party, MGMT, The Killers e Tomcraft) a diretora consegue um resultado positivo, ainda que seja um filme muito fácil de odiar. 


Um dos eventos cinematográficos de 2023! 
 
⭐️⭐️⭐️ BOM 😊 


sábado, 11 de novembro de 2023

PLANETA DOS ABUTRES (2023)

 


Uma experiência incrível!

   Nesta surreal série animada de ficção científica dos criadores Joseph Bennett  e Charles Huettner, a tripulação sobrevivente de um cargueiro interestelar que se acidentou acaba ficando presa a um planeta estranho e belo, porém implacável. Essa jornada assustadora por um planeta alienígena mostra onde o menor desequilíbrio ecológico pode ter consequências drásticas além da falta de comedimento e o eterno desejo da humanidade de conquistar o desconhecido. Nesse ambiente, eles precisam sobreviver para fugir ou serem resgatados. Mas enquanto os sobreviventes enfrentam dificuldades de localizar a nave acidentada e os colegas desaparecidos, a nova casa deles se revela um mundo hostil que cresceu sem interferência humana. 

     A produção é impecável, cada detalhe desse planeta salta na tela e se mostra vivo em uma riqueza de detalhes, tudo se transforma e acontece tão rápido que você não consegue piscar os olhos, além da animação ser bem produzida e bastante original. Planeta dos Abutres” é baseado em um curta-metragem lançado em 2017 pelo Toonami. A série é uma das grandes surpresas de 2023. Encantadora do início ao fim e um presente aos fãs de ficção científica! 

👀 Disponível na HBO MAX - (12 episódios)

⭐️⭐️⭐️⭐️⭐️ Excelente 

terça-feira, 29 de agosto de 2023

RETRATOS FANTASMAS (2023) de Kleber Mendonça Filho

 

  O TEMPO ALTERA OS LUGARES! 

Essa frase carrega a história em primeira pessoa do docu-ensaio de Kleber Mendonça Filho, um recorte bastante individual e sentimental de memórias suas que se cruzam com os caminhos traçados pela cultura cinematográfica tradicional do Recife e do Brasil. A história age como um ponto de ligação para muitas coisas além do mundo cinematográfico, é um estudo quase urbanista, de luta política que deixou suas marcas. Os Retratos Fantasmas são lugares que só existem agora na memória, ou foram alterados pelo tempo e possuem simbologia pessoal interligada como uma raiz que toda cidade tem para existir de fato. Seu recorte de arquivos e imagens de época é um paradoxo a transformação de uma metrópole urbana bastante massacrada com o tempo, transbordando um romantismo e valorizando a sua vivência e história. O diretor mostra seu talento como documentarista transportando o expectador a cidade de Recife, te faz ser parte do lugar e das histórias, seja em detalhes que transitam em suas obras cinematográficas ou mesmo em como o cinema tentou resistir aos obstáculos mais diversos, do fechamento das salas de cinema, a desvalorização do cinema de rua. Um contraste que não deixa de exemplificar também os  novos costumes de consumo. Em uma interessante sequência ele praticamente mapeia a tendência mercadológica atual, onde o cinema deixa de ser o prioritário do espaço urbano, se escondendo ao redor de lojas, onde o cinema sozinho não consegue mais ter força para se manter, é necessário um agregado. Isso nem é claramente dito mas fica óbvio na exibição quando ele mostra um cinema sendo invadido por lojas. Praticamente o caminho do cinema dentro de shopping. O filme nos mostra que até mesmo seus letreiros faziam parte da paisagem natural da cidade, da história de momentos vividos ao ser visto fotos de pessoas comuns com o títulos dos filmes exibidos na época. A força maior e emocionante do filme é sentir toda verdade bucólica de alguém que realmente respira e se preocupa com cinema como uma arte que constrói caráter.

Uma obra prima que deve ser descoberta por quem ama cinema. 🎞 

ÓTIMO ⭐️⭐️⭐️⭐️ 

Em cartaz nos cinemas!





quarta-feira, 31 de maio de 2023

O ÚLTIMO ÔNIBUS (2021) - "The Last Bus" de "Gillies MacKinnon"


     Uma jornada de gentileza e ternura, é como podemos simplificar o "road movie" inglês que mostra o diário de viagem de Tom Haper (Timothy Spall) que passou 90 anos num círculo de 1400km de distância e decide mesmo com uma saúde delicada percorrer o trajeto feito por ele e seu amor Mary (Phyllis Logan), de forma inversa para concluir sua história de vida. Ainda que não seja algo extraordinário por olhares mais modernos, a delicadeza de como esse choque cultural é exposto ao personagem encontrar uma sociedade corrompida e tóxica de todas as formas possíveis, faz Tom Haper mesmo dentro de sua bolha conectar-se com um mundo moderno que ele nunca experimentou e ainda dar uma lição de humanidade que só pessoas com bagagem podem proporcionar.


  O personagem carrega sua vida em uma pequena maleta e sem ajuda das tecnologias disponíveis, utilizando lembranças e um mapa. O diretor Gillies MacKinnon realiza uma obra simples que entende as limitações de não enxergar a gentileza ou a melhor idade com uma profundidade de valor, de história e de aprendizado. Afinal, cada qual vive uma batalha sua e particular que pode ou não ser expansiva e nem por isso deve ser desvalorizada. O filme nos mostra a vida que passa num piscar de olhos, no respeito mútuo, nas perdas e nas vitórias também. Em como as vezes um simples ato de pegar um ônibus coletivo e fazer diferença na vida de outra pessoa também é importante, seja na proteção de valores, seja em um conselho sobre guerra ou mesmo num simples conforto de um abraço em um momento de choro.

     Para cumprir com uma promessa feita à sua mulher, antes de ela morrer, Tom deixa sua casa de 50 anos em um vilarejo no norte da Escócia e atravessa o país rumo ao sul, ao lugar onde nasceu, próximo à fronteira com a Inglaterra. As paisagens são belas e junto as camadas emocionais dessa jornada deixa tudo bem confortável ao expectador. O longa foi filmado em Glasgow e os seus arredores e boa parte da trama se passa no Glasgow Vintage Vehicle Trust, um museu dedicado a meios de transportes escoceses. O exterior foi usado para a construção de diversos pontos de ônibus, enquanto o interior serviu de estúdio para a arquitetura de cenários. Spall, de 66 anos, que interpreta Tom, de 90, com uma maquiagem que o envelhece, consegue um tom equilibrado e minimalista no drama do personagem. Um filme triste, mas determinante para quem ama de verdade alguém até o limite e nao há obstáculos pra isso. Imperdível.


O drama com toques agridoces estreia nesta quinta-feira, 1º de junho, nos cinemas do Brasil. Consulte a programação. A distribuição é da Pandora Filmes.








quarta-feira, 17 de maio de 2023

O CONVENTO - "Consecration" de "Christopher Smith"

 

            

        A volta do diretor Christopher Smith após pequenas pérolas do gênero como Triângulo do Medo consegue novamente abrir questionamentos sobre como enxergamos o cinema de terror atualmente, algo que se tornou particular em suas obras. A busca incessante ao entretenimento de horror pode anular o mesmo e dificultar a experiência quando ela pode ser uma contemplação de arte. O Convento apresenta algo bem interessante nesse sentido, não que seja uma obra-prima ou não tenha falhas, não é sobre isso, e sim em como o terror também pode ser enxergado com beleza mesmo entregando dor, medo e sangue em sua própria essência.

          Os filmes sobre freiras e seitas religiosas são realizados constantemente e já são um subgênero à parte com poucas produções que realmente trazem representação artística. O grande ponto alto deste longa está na entrega de Jena Malone que realmente apresenta uma atuação convincente até mesmo quando nem o próprio roteiro ajuda. Suas alucinações são poéticas e assustadoras na mesma medida, ela vive Grace, uma oftalmologista britânica que viaja para um convento à beira-mar na Escócia, após receber a notícia de que seu irmão, um padre, morreu lá sob circunstâncias misteriosas. Não foge do que o público desse tipo de filme espera mas também a atreve a desafia-lo. 

Em última instância, quando as peças se encaixam e a ameaça é finalmente revelada, o diretor vira o jogo ao próprio espectador, no que realmente ele acredita e espera de uma história de terror. Obviamente os fãs do gênero vão lembrar de um grande clássico bem semelhante, Os Demônios (1971) de Ken Russel, tão interessante como esse O Convento, que ainda tem tempo de trazer uma linda fotografia (mesmo com baixo orçamento e efeitos especiais simples) e a quebra de expectativas de maneira crua trabalhando mais o cinema em si que a indústria que ele pertence.

🌟🌟🌟 BOM